TEXTO PARA O CURSO DE DI
Por:
Por:
Maria
de Lourdes Carvalho Nunes Fernandes
Suzana
Marly da Costa Magalhães
Introdução
No passado,
a deficiência mental (DM) era considerada como doença – a oligofrenia –
originada de uma diversidade de anomalias orgânicas, para ocasionar um déficit
irreversível no funcionamento mental. Neste sentido, o atraso mental tem-se
traduzido como limitação nas aquisições dos conhecimentos escolares, sociais e
da vida diária, no ritmo mais lento de desenvolvimento cognitivo e na
incapacidade, de aquisição das funções mentais superiores.
O enfoque
psicométrico impôs-se no final do século XIX e no primeiro quartel do século
XX, com a pretensão de medição da capacidade geral ou de aptidões intelectuais
específicas através dos conceitos de Idade Mental (IM) e de Quociente de
Inteligência (QI). É preciso ressaltar o fato de que a concepção de deficiência
mental vincula-se sempre, estreitamente, a uma teoria da inteligência: no caso
da Psicometria, existia a crença nas qualidades imutáveis dos atributos
intelectuais, e na possibilidade de sua mensuração exata.
A definição de debilidade do sujeito vem sendo
feita de forma essencialmente psicométrica, a partir da avaliação do nível de
acertos alcançado na realização de certas tarefas. Os testes tentam mostrar que
o indivíduo não adquiriu determinados instrumentos cognoscitivos, mas não se
propõem a esclarecer as características específicas e os mecanismos implicados
no processo de constituição da organização especial de seu psiquismo, nem
explicitam suas necessidades, seus processos e recursos especiais necessários à
sua aprendizagem (CARLO, 1999, p. 30).
A DM seria
compreendida, nesta perspectiva, como ausência das aptidões inatas de abstração
e generalização a partir do insucesso na resposta aos testes de escores. Convém
ainda ressaltar o uso indiscriminado dos testes de QI, o que resultou na adoção
de medidas práticas de isolamento e de tratamento do deficiente mental nas
classes e escolas especiais. Por outro lado, a concepção evolutiva esboçou-se
na ênfase da maturação orgânica, com ritmos lentos, mas contínuos, no desenvolvimento
mental do indivíduo portador de DM. Esta tese apresentou aspectos progressistas
por postular uma intervenção pedagógica dinamizadora, que favoreceria algum
avanço cognitivo. Convém ressaltar, no entanto, que este enfoque não reconhece
o fato do desenvolvimento incompleto na deficiência mental.
Na abordagem
comportamental, por sua vez, a DM é considerada como conduta atrasada, através
de uma investigação e tratamento dos aspectos observáveis dos baixos
rendimentos na realização de atividades. Vale salientar, contudo, que o enfoque
comportamental concebe a conduta do deficiente originando-se da história
genética e adaptativa do indivíduo, e, portanto, sujeita a uma modificação
através de uma organização de estímulos ambientais pelo professor.
(…) uma análise que examina todo tipo de estímulos
(antecedentes ao comportamento e advindos dele, estímulos discriminativos e
estímulos reforçadores) dos quais a conduta, neste caso, a conduta atrasada,
constitui função. Da modificação desses estímulos e, em geral, da intervenção
sobre o meio estimulante, o psicólogo de orientação comportamental espera a
mudança da conduta atrasada e a melhoria do rendimento da pessoa (FIERRO, 1995,
p. 235).
Esta
perspectiva revela-se insuficiente pela ênfase no condicionamento de
determinadas habilidades e hábitos ou eliminação de condutas indesejáveis, mas
não pondera as características fundamentais da inteligência, que são afetadas
pelo atraso mental. E a vertente construtivista, que engloba, principalmente, a
contribuição de Piaget, Vygotsky, Wallon, Luria, Leontiev, dentre outros? O
objetivo deste texto consiste apenas na análise das contribuições de Piaget e
Vygotsky à compreensão da deficiência mental, assinalando as características
fundamentais da abordagem construtivista, que se impôs como a vertente mais
aceita nas últimas décadas, influenciando nas diretrizes e currículos de
educação especial no Brasil. Daí a importância de um estudo mais detalhado
destas teorias, que superaram as abordagens já descritas – psicométrica,
comportamental, cognitivista, no meio acadêmico e nas escolas brasileiras.
O enfoque piagetiano da deficiência mental
O estudo
psicogenético do desenvolvimento, proposto por Piaget, pondera o
desenvolvimento mental como organização progressiva da mente, a partir de
processos simultâneos de assimilação e acomodação. A assimilação consiste na
incorporação do meio à estrutura cognitiva, onde o meio passa a existir, na
mente do sujeito, na forma de “esquemas”. Os esquemas, por sua vez, são unidades
mentais que representam ações ou conceitos e que tendem a se combinar, formando
estruturas cada vez mais complexas. A mente representa o real – os estímulos
sensoriais – através de esquemas: é o processo de assimilação. Depois, ocorre a
acomodação, que se caracteriza pelo “reajuste” da estrutura cognitiva ao meio,
onde se incorporam elementos de experiência aos esquemas mentais; de fato, a
acomodação acontece na mudança dos esquemas mentais depois do confronto do
sujeito com a realidade.
As fases de
desenvolvimento cognitivo¹ caracterizam-se, cada uma delas, por um tipo
específico de estrutura mental, de ordem motora, intelectual e afetiva. A
estrutura mental, na verdade, favorece um modo peculiar de resolução de
problemas, buscando se adequar às demandas do meio. Aí interfere o processo de
equilibração, que consiste precisamente no reajustamento das estruturas mentais
às transformações exteriores, rumo a uma adaptação sempre mais precisa à
realidade concreta. Conclui-se que Piaget considera as estruturas mentais como
produto de trocas entre o sujeito e o meio, em busca de uma adaptação cada vez
maior ao meio.
Piaget
ocupou-se do estudo exclusivo do desenvolvimento das crianças ditas normais.
Todavia, sua grande colaboradora, Barbel Inhelder, destacou-se nas pesquisas
relativas ao desenvolvimento mental atípico, com a elaboração de uma análise
clássica no campo da deficiência – The diagnosis ofreasoning in the mentally
retarded (O diagnóstico do raciocínio no indivíduo mentalmente retardado),
editado em 1968, fundamentando as teorias subsequentes da deficiência mental.
Utilizando-se
do método clínico piagetiano, examinando mais de 150 casos patológicos, INHELDER
(1968) concluiu que a sequência das aquisições das crianças portadoras de
deficiência mental e das crianças normais seria idêntica, mas com diferentes
ritmos de passagem de uma fase a outra e com pontos de “estrangulamento”, na
impossibilidade de atingir as fases finais de desenvolvimento cognitivo. Para o
deficiente mental, seria inviável o pensamento formal, a dedução e a síntese, a
resolução de contradições lógicas e a consciência dos próprios processos
mentais.
Funcionalmente,
a deficiência mental caracterizar-se-ia pelo egocentrismo, que se traduz pela
impossibilidade de abandonar o ponto de vista pessoal, e, deste modo, não se
atingem as relações objetivas do real. Como se pode compreender a realidade
objetiva do mundo físico, separada da percepção e opinião do sujeito? Através
da construção da noção de conservação. Trata-se da compreensão de que uma
dimensão da realidade física permanece constante, apesar da variação de
aspectos sensoriais. O exemplo da massa de argila pode ser esclarecedor: a
quantidade de argila conserva-se mesmo que se altere o comprimento ou a
largura. A capacidade de conservação é construída lentamente pelo sujeito em
diversas áreas da experiência física: volume, substância, tempo, velocidade,
dentre outras, no rumo da articulação de todas estas capacidades de conservação
numa mesma estrutura mental, como condição indispensável para a elaboração de
um universo objetivo, caracterizado pela permanência de determinados atributos.
No caso do deficiente mental, não existe a possibilidade de integração de todas
as capacidades de conservação, em todas as áreas já referidas – volume, área,
substância. Portanto, não há a possibilidade de constituição de uma
representação estável de mundo físico.
Convém
relembrar que o processo de equilibração consiste precisamente na adequação das
estruturas mentais à realidade, rumo a uma adaptação mais precisa às demandas
do meio. Ocorre que o equilíbrio operatório pleno é atingido na fase do
operatório formal (11 anos em diante) – último estágio de desenvolvimento
cognitivo, inacessível aos portadores de DM, impossibilitando, para eles, um
nível mais avançado de adaptação/explicação da realidade. Com efeito, definir a
DM nos termos da teoria piagetiana implica na comparação da deficiência mental
com o estágio cognitivo de máximo equilíbrio operatório – o estágio das
operações formais (11 anos em diante), para assinalar as discrepâncias do
deficiente mental em relação ao raciocínio adulto.
Na verdade,
a DM poderia ser considerada precisamente a fixação em fases anteriores de
desenvolvimento. As fixações dos indivíduos portadores de DM verificam-se em
vários níveis de desenvolvimento, ocasionando um ritmo mais lento no curso do
desenvolvimento cognitivo e, evidentemente, a definição de distintas
características mentais, com nível precário de equilíbrio, devido à precária
capacidade adaptativa às demandas do meio. Extraem-se, assim, duas
características do desenvolvimento cognitivo das pessoas portadoras de
deficiência mental: ritmo lento e horizonte menor do desenvolvimento (BEYER,
1996).
O resultado
seria a incidência de oscilações constantes na interpretação dos fenômenos,
interpretações que se vinculam a distintos níveis de desenvolvimento cognitivo,
instaurando uma extrema flutuação nos processos de raciocínio, fato que seria
evidenciado num grau muito elevado em relação aos indivíduos considerados normais,
que poderiam oscilar no julgamento das situações-problema, mas sem a extrema
indecisão dos indivíduos portadores de DM. Os indivíduos normais oscilariam.
(…) em momentos sucessivos dessa equilibração em
espiral, onde os aprendizes constroem contradições às suas ações e idéias (…)
Por outro lado, as contradições podem ocorrer na forma de duas teorias que
tanto parecem plausíveis como contraditórias, ou de teorias que se tornam
insuficientes diante de novos dados (FOSNOT, 1999, p. 32).
As
oscilações patológicas, próprias da deficiência mental, distinguem-se, ao
contrário, pela fragilidade do pensamento lógico, com a extrema persistência do
egocentrismo. A oscilação patológica, nesta perspectiva, acusaria o caráter
regressivo do pensamento, que optaria sempre por formas mais simples de
compreensão da realidade quando confrontado com fatos experimentais
contraditórios. O indivíduo portador de DM não alcançaria o último estágio de
desenvolvimento cognitivo – o operatório formal, caracterizado pelo pensamento hipotético-dedutivo
– esboçado em média a partir dos 11 anos, centrado nas categorias puramente
conceituais, distanciadas da realidade concreta. Neste período, engendra-se a
capacidade de elaborar hipóteses e planejar situações, antecipando relações
virtuais entre acontecimentos, ultrapassando, assim, a estrita capacidade de
compreensão das relações entre coisas que ocorrem no presente imediato.
De fato, o
pensamento na fase do operatório formal manifesta-se na forma do raciocínio
eminentemente proposicional, desvinculado dos fenômenos concretos: é a
capacidade de pensar sobre o pensado – a metacognição, vinculada aqui ao
estágio das operações formais. A deficiência mental influenciaria, portanto, no
ritmo de aprendizagem, no estágio final atingido e no caráter não-espontâneo do
desenvolvimento. Um outro aspecto seria o fato de que o nível final das
operações intelectuais fosse bastante diferenciado, nunca se alcançando um
equilíbrio definitivo. Esse falso equilíbrio configura o que Inhelder chamou de
“viscosidade de raciocínio” ou “viscosidade genética”. Para Piaget, o trabalho
de Inhelder tem como um dos seus méritos mais relevantes a descoberta de que as
pessoas com distúrbios cognitivos significativos caracterizam-se por evidenciar
um equilíbrio operatório sempre inacabado (BEYER, 1996, p. 37).
Consequentemente,
a aprendizagem da criança com deficiência mental estaria comprometida devido a
esse falso equilíbrio, haja vista que à criança com DM faltaria a capacidade de
objetivação do próprio pensamento, com a subsequente capacidade de planejamento
das ações que se consubstanciam como cerne de habilidade metacognitiva. Dessa
forma, como a criança teria flexibilidade em organizar seus instrumentos
intelectuais, de planejar e monitorar suas ações? O “falso equilíbrio”
influenciaria sobremaneira a capacidade metacognitiva.
Quais as
implicações pedagógicas da Epistemologia Genética no campo da DM? Em primeiro
lugar, favorece a adaptação curricular às características próprias do portador
de DM, que, como já foi descrito, centram-se na fixação em uma determinada fase
de desenvolvimento cognitivo. Este é um primeiro aspecto. Uma outra dimensão
pedagógica a ser fomentada seria a catalisação da oscilação patológica através
de situações-problema, para ensejar o progresso cognitivo, apesar da oscilação
ser um atributo próprio da DM. É necessário, outrossim, favorecer as atividades
visando ao incremento das capacidades metacognitivas – de planejamento das
ações, de objetivação do pensamento – que seriam afetadas pela condição da DM,
e que são imprescindíveis para a aquisição do estágio das operações formais.
A abordagem vygotskyana de deficiência mental
A teoria
sócio-interacionista de Vygotsky, elaborada nas décadas de 20 e 30, continua
cumprindo um papel de destaque na compreensão da deficiência mental e
influenciando práticas pedagógicas. De fato, VYGOTSKY (1994) dedicou-se ao
estudo das funções psicológicas superiores que difere qualitativamente das
funções psicológicas elementares – os reflexos (sucção, preensão…), as reações
automatizadas (mover a cabeça em direção a um som muito alto) ou simples
associações (não pôr o dedo na tomada). As funções psicológicas superiores
caracterizam-se, por sua vez, como o modo de funcionamento mental típico do
homem e que envolvem mecanismos psicológicos complexos elaborados a partir da
interação do indivíduo com o mundo exterior, ou seja, o sujeito inserido em uma
cultura, onde sua relação com o meio é mediada por sistemas simbólicos. Daí,
infere-se que a aquisição da linguagem é fator marcante no desenvolvimento
psicológico.
O
desenvolvimento da criança deficiente mental é semelhante ao da criança
“normal”, muitas das funções intelectuais /psicológicas da criança com
deficiência mental podem não ter sido atingidas pela incapacidade. A diferença
seria que as crianças com DM não sabem utilizar recursos culturais,
configurando-se numa limitação ou incompletude do desenvolvimento cultural, num
comprometimento de suas funções psicológicas superiores.
Um exemplo
deste fato é apresentado por VYGOTSKY e LURIA (1996) em relação à memória: não
há uma diferença significativa no uso da memória natural entre crianças
“normais” e crianças comprometidas intelectualmente. Entretanto, quando, no
experimento proposto, empregaram-se meios (cartões com figuras) para
auxiliá-las na memorização da série de palavras, houve uma diferença expressiva
no número de respostas corretas entre os dois grupos de crianças – as primeiras
souberam selecionar e criar relações entre as figuras e as palavras a serem
lembradas (exemplo: figura-trenó, palavra – neve), enquanto as crianças com
déficit intelectual selecionavam aleatoriamente as figuras, sem o objetivo de
associá-las às palavras para auxiliar na recordação, continuando a usar apenas
a memória natural.
Isso
demonstra a incapacidade das crianças com DM no emprego voluntário e consciente
de um elemento (cartão com figura) para ajudar na tarefa proposta (memorização
de palavras), por solicitar o funcionamento dos processos psicológicos
superiores – ações Conscientemente controladas, atenção voluntária, memorização
ativa (OLIVEIRA, 1993). Vale salientar
ainda que a criança com deficiência mental apresenta um ritmo mais lento na
interiorização da linguagem, que, por sua vez, configura-se como origem do ato
voluntário consciente. Com efeito, pode-se inferir que a criança com DM
demonstra uma alteração de conduta diante das instruções verbais, devido ao
prejuízo na internalização da linguagem e à sua dificuldade de auto-regulação:
O fenômeno é
completamente diferente no caso da criança atrasada. Durante o desenvolvimento,
também esta criança assimila a linguagem, mas os processos nervosos em que se
baseia mostram desvios patológicos e não permitem o aparecimento de sistemas
complexos e móveis de conexões, necessários para o normal funcionamento da
linguagem. As conexões da linguagem da criança não revestem, portanto, esse
papel ativo necessário para a formação da atividade intelectual e para a
regulação do comportamento (LURIA et al, 1991, p. 94).
Vygotsky
ressalta que a incompreensão da DM reside, portanto, na desconsideração das
funções psicológicas superiores como novas possibilidades para o
desenvolvimento do deficiente. As características orgânicas continuarão a
existir, mas podem ser substituídas ou redimensionadas através dessas funções,
fomentadas a partir do convívio social e de inserção na cultura:
A pessoa com deficiência, comumente, é vista como
aquela que se diferencia do tipo humano “normal”, entretanto, o desenvolvimento
comprometido pela deficiência apresenta uma expressão qualitativamente peculiar
que se diferencia conforme o conjunto de condições que se realiza (…) Porém, as
leis do desenvolvimento são iguais para todas as pessoas (deficientes ou não) e
a diferenciação do padrão biológico típico do homem implica uma alteração da
forma de enraizamento do sujeito na cultura. A cultura provoca uma reelaboração
do curso do desenvolvimento humano, sob novas condições e sobre novos
fundamentos (CARLO, 1999, p. 77).
Dessa forma,
explica-se por que o fracasso acompanha o deficiente mental: devido à exigência
de um desempenho que não condiz com o seu ritmo de desenvolvimento e de
aprendizado. Deve-se assim compreender como ocorre a aprendizagem no portador
de DM, viabilizando um ensino que pondere e atenda as especificidades destes
indivíduos.
Considera-se,
portanto, a noção de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) de Vygotsky, como
categoria central no redimensionamento da educação dos deficientes mentais:
A Zona de Desenvolvimento Proximal refere-se,
assim, ao caminho que o indivíduo vai percorrer para desenvolver funções que
estão em processo de amadurecimento e que se tornarão funções consolidadas,
estabelecidas no seu nível de desenvolvimento real. A Zona de Desenvolvimento
Proximal é, pois, um domínio psicológico em constante transformação: aquilo que
uma criança é capaz de fazer com a ajuda de alguém hoje, ela conseguirá fazer
sozinha amanhã. É como se o processo de desenvolvimento progredisse mais
lentamente que o processo de aprendizado (…). Interferindo constantemente na
Zona de Desenvolvimento Proximal das crianças, os adultos e crianças mais
experientes contribuem para movimentar os processos de desenvolvimento dos
membros imaturos da cultura (OLIVEIRA, 1993, p. 60).
VYGOTSKY (1994) enfatiza o processo de construção das aquisições com a
mediação docente, em que se minimizaria, num primeiro momento, a noção de
desenvolvimento real – as aquisições autônomas. O desenvolvimento mental só
pode ser determinado se forem revelados os seus dois níveis: o nível de
desenvolvimento real e a Zona de Desenvolvimento Proximal. A adoção da
categoria de ZDP conduziria a um trabalho pedagógico em que o professor deteria
a função de mediador, secundando o processo de aprendizagem, com a finalidade
de fomentar a capacidade de regulação da inteligência como habilidade
metacognitiva por excelência. De fato, o comprometimento do desenvolvimento
espontâneo, próprio da deficiência mental, remete à viabilização de uma ação
interventiva:
A aprendizagem depende, portanto, do
desenvolvimento prévio e anterior, ao mesmo tempo que depende do
desenvolvimento proximal do sujeito. Não estão só em causa as atividades que
ele pode aprender com a ajuda e a intervenção intencional dos outros, ou seja,
ele aprende por humanização, por meio de mediatização. As pessoas que rodeiam o
sujeito, ou melhor, a criança (o mediatizado), não são objetos passivos ou
simples instrumentos do seu desenvolvimento, mas sim companheiros ativos que
guiam, planificam, regulam, selecionam, filtram, começam e terminam as condutas
da criança. São agentes do seu desenvolvimento (FONSECA, 1998, p. 68).
Dessa forma,
o ensino – como atividade mediada – promoveria um aprimoramento da performance
cognitiva através da fomentação de habilidades metacognitivas de autocontrole e
auto-regulação, na medida que auxiliasse a criança com DM a utilizar a
linguagem e/ou outros instrumentos no planejamento, controle e regulação de
suas ações.
Referências bibliográficas
BEYER, H. O. O fazer psicopedagogico: a abordagem de Reuven Feuerstein a
partir de Piaget e Vygotsky. Porto Alegre: Mediação, 1996.
CARLO, M. M. R. P. Se essa casa fosse nossa… instituições e processos de
imaginação na educação especial. São Paulo: Plexus Editora, 1999.
FIERRO, A. As crianças com atraso mental In: COLL, C; PALÁCIOS;
MARCHESI, A. (Orgs.). Desenvolvimento psicológico e educação: necessidades
educativas especiais e aprendizagem escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
FONSECA, V. Aprender a aprender: a educabilidade cognitiva. Porto
Alegre: ARTMED, 1998.
FOSNOT, C. T. Construtivismo. Porto Alegre: Artmed, 1999. INHELDER, B. The diagnosis of reasoning in
the men-tally retarded. New York: The John Day Company, 1968.
LURIA, A. R.;LEONTIEV, A.; VYGOTSKY, L. S. Bases psicológicas da
aprendizagem e do desenvolvimento. São Paulo: Moraes, 1991.
OLIVEIRA, M. K. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento um processo
sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1993.
PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1989.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes,
1994.
LURIA, A. R. Estudos sobre a história do comportamento: símios, homem
primitivo e criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
NOTAS
1 – As fases de desenvolvimento cognitivo, segundo PIAGET (1989):
sensório motora (0-2 anos); pré-operatória (2-7 anos); operações concretas (7
-10 anos); operatória formal (11 anos em diante).
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